Contabilidade
do período do seguro desemprego como tempo de Contribuição para o Regime Geral
de Previdência Social - Projeto de Lei 4.080, de 2012
Filipe Vieira Pombo.
O Projeto de
Lei nº 4080, de 2012, visa acrescentar a contabilidade do período do “seguro-desemprego”,
no interregno de um trabalho e outro, como contagem do tempo de contribuição
para o Regime Geral de Previdência Social, ou seja, se entre a demissão
involuntária de um emprego e a admissão em outro houve um período em que a
pessoa ficou desempregada e esta pessoa contribuía para a previdência social,
este período será contado para efeito da aposentadoria por tempo de
contribuição, porque, apesar de não trabalhar, a pessoa em pouco tempo
encontrou outro emprego e estava protegida pela Previdência por meio do
seguro-desemprego; isso significa também, que por ter se beneficiado do
seguro-desemprego implica-se que, antes do benefício, a pessoa já contribuía
com a previdência e a falta de emprego foi um fato excepcional.
O Projeto de
Lei não visa incentivar o uso do seguro desemprego, porque o benefício e sua
duração são proporcionais ao tempo e ao valor da contribuição do trabalhador;
além disso, a perda do antigo emprego não pode ter sido voluntária e a pessoa
precisará encontrar outro emprego durante o tempo em que será beneficiada, para
que o intervalo do desemprego seja contabilizado para efeitos da aposentadoria
por tempo de serviço (de contribuição).
A Previdência
Social é uma das bases da Seguridade Social, junto com a Assistência Social e a
Saúde. Ela visa proporcionar ao contribuinte e sua família, suficiência pecuniária
quando de impossibilidade para o trabalho ou de qualquer outra indigência
(pobreza) social, protegendo-o dos “riscos sociais”, das necessidades
“socialmente relevantes” e, em outras palavras, protege-o e protegendo sua
família de situações de sofrimentos e privações.
Nas origens da
previdência, seu funcionamento envolvia o pagamento de um valor pela proteção
contra um risco, parecido com um seguro, mas com o tempo o elemento risco foi
deixando de fazer parte de alguns casos abrangidos pela previdência, como a
aposentadoria e a licença maternidade (não envolve risco, porque não é uma
fatalidade ou um fato inesperado, é sim um conjunto de coisas que pode ser que
aconteçam, é um conjunto de possibilidades esperadas e que, por isso, se dá o
nome de contingências sociais).
Assim, a
previdência, para proteger aqueles contribuintes que se encontram afetados por
uma situação de necessidade ou privação, precisam pagar os benefícios, ou seja,
uma quantia pecuniária ao trabalhador para seu sustento e também fornecer
serviços que o ajudem a se recuperar do desemprego.
A lei nº
8.213/91 dispõe sobre os planos de benefícios da Previdência Social e dá outras
providências (o que implica em serviços também). Tal lei foi editada junto com
a Lei nº 8.212/91, que dispõe sobre a Seguridade Social, isso porque em 1990 o
Programa de reforma Administrativa do Governo Collor unificou o Ministério do
Trabalho e a Previdência Social.
Essas leis, em
verdade, não vieram somente para organizar os programas de previdência e
seguridade social através do Programa do Governo Collor, até porque tal governo
promovia o desenvolvimento neoliberal e a industrialização através de políticas
de privatização. Elas vieram sim, porque desde a muito as lutas sociais no
mundo todo difundiam a necessidade de garantias de direitos fundamentais,
sociais e coletivos, e os traumas das duas Grandes Guerras, da Guerra Fria, e
das ditaduras Latino-Americanas proporcionavam grande emotividade da população,
pelo menos urbana, e a abertura política no Brasil ainda era recente, ou seja,
as pessoas ainda tinham medo de que houvesse um retrocesso democrático o que as
motivava na participação dos movimentos sociais de luta.
No contexto em
que se insere o ano de 1991, era propícia a atuação dos trabalhadores e seus
sindicatos no sentido de pressionar politicamente o Governo e de promover a
repercussão na mídia, ou seja, à época da produção dessas duas leis a força
política e social dos trabalhadores era muito grande.
Dessa forma, é
razoável que no Brasil a seguridade social, como direito fundamental do
cidadão, através de, entre outros artigos, o artigo 201 e parágrafos da
Constituição e através da Lei nº 8.212/91, artigo 1º, parágrafo único, tenha estabelecido
diversos princípios.
Com relação à
Previdência, os princípios e objetivos trazidos pela doutrina são os seguintes:
i.
da obrigatoriedade de filiação (todos devem
contribuir);
ii.
da
solidariedade ou da compensação nacional (a arrecadação pelo Estado se reverte
em socialização da pobreza, ou seja, a contribuição da maioria da população se
reverte em diminuição da pobreza da minoria que não pode contribuir);
iii.
da unicidade das prestações (o beneficiado
não pode obter mais de um benefício);
iv.
da compreensibilidade (a seguridade protege
contra qualquer eventualidade e não apenas a algum risco específico);
v.
da automaticidade das prestações (o pagamento
é automático);
vi.
da imprescritibilidade do direito ao
benefício (não prescreve enquanto durar a situação da pessoa);
vii.
da expansividade social (o sistema da
seguridade deve garantir o acesso do maior numero possível de pessoas);
viii.
do in
dúbio pro operário (os recursos devem dar preferência aos direitos dos mais
miseráveis).
Do exposto é
possível comentar os princípios e objetivos da Previdência, que são bastante
parecidos com os da Seguridade, e que estão elencados na Lei nº 8.213/91, em
seu art. 2º, e são:
I – universalidade de participação dos planos
previdenciários (esta relacionada ao mesmo tempo ao que a doutrina chama de
obrigatoriedade de filiação e ao que a Lei 8.212 chama de universalidade de
cobertura e do atendimento);
II – uniformidade e equivalência dos benefícios e
serviços às populações urbanas e rurais;
III – seletividade e distributividade na prestação dos
benefícios (aqui a norma não menciona o serviço social como na Lei da Seguridade
Social);
IV – cálculo dos benefícios considerando-se os
salários-de-contribuição corrigidos monetariamente (os benefícios devem ser
proporcionais à contribuição corrigida com base na correção monetária do
salário);
V – irredutibilidade do valor dos benefícios de forma a
preservar-lhes o poder aquisitivo;
VI – valor da renda mensal dos benefícios substitutos do
salário-de-contribuição ou do rendimento do trabalho do segurado não inferior
ao do salário mínimo;
VII – previdência complementar facultativa, custeada por
contribuição adicional (a lei procura incentivar também a contribuição para a
previdência complementar, mas não é obrigatória);
VIII – caráter democrático e descentralizado da gestão
administrativa, com a participação do governo e da comunidade, em especial de
trabalhadores em atividade, empregadores e aposentados (O parágrafo único diz
que a participação será efetivada a nível federal, estadual e municipal. É a
chamada gestão quadripartite, ou seja, formada pelas pessoas do caput –
trabalhadores, empregadores, aposentados – e pela pessoa do Estado, sendo que o
parágrafo único exige a descentralização e a representatividade em todos os
níveis da federação nos quais a gestão atuar).
Repare-se que
estes princípios são parecidos com os princípios da seguridade social e tem
inclusive quase o mesmo número, o parágrafo único do artigo 1º da lei 8.212 com
sete alíneas e o artigo 2º da lei 8.213 com oito incisos, diferenciando-se
apenas no que segue: o inciso IV relaciona os salários e os benefícios para
efeito de correção monetária, o inciso VII acrescenta a faculdade de se obter
uma previdência complementar adicional à previdência social e a Previdência não
menciona a diversidade da base de financiamento como na seguridade.
Agora, depois
de todo o exposto sobre princípios, é possível voltar a falar da Proposta de
Lei nº 4.080, de 2012.
A
aposentadoria por tempo de contribuição exige que o trabalhador, para se
aposentar, contribua com o Regime Geral de Previdência Social pelo prazo mínimo
de 30 anos se mulher e 35 se homem. Acontece, todavia, que a Lei 8.213 prevê
algumas hipóteses em que, mesmo sem que a pessoa contribua para o RGPS por um
período de tempo, considerar-se-á como se tivesse contribuído para efeito da
contagem do prazo de 30 ou 35 anos mencionado. Tais hipóteses estão previstas
no artigo 55 da referida lei e contribuem para a aplicação dos princípios todos
mencionados, levando em conta inclusive o aspecto histórico também mencionado e
a questão da indigência social.
A proposta
visa incluir nesse rol mais um inciso, o seguro-desemprego. Isso estimula o
trabalhador a retomar a vida de trabalho, porque o inciso só permite a contagem
para efeito da contagem do prazo de contribuição no RGPS se o gozo do
seguro-desemprego se der intercaladamente entre um emprego e outro.
Além disso, a
proposta também pretende incluir mais um benefício de caráter previdenciário no
tempo de contagem do prazo da aposentadoria por tempo de contribuição, porque
tendo o seguro-desemprego a natureza de benefício previdenciário e dizendo o
inciso III do artigo 201 da Constituição Federal que “a proteção ao trabalhador
em situação de desemprego involuntário ficará a cargo da Previdência Social”, é
importante adequar a lei à norma constitucional, à função de Previdência e à
possibilidade da aplicação dos princípios da universalidade de cobertura e do
atendimento, da compreensibilidade, da expansividade social, do in dúbio pro operário e da solidariedade.
Todos esses
princípios são protegidos pela previdência e seus benefícios. O
seguro-desemprego não foge a essa função de proteger o trabalhador.
Diante o
exposto ainda cabe a duvida: se, na prática, a maior parte das pessoas passa longe
do mínimo de 30 ou 35 anos mínimos exigidos para a aposentadoria por tempo de
serviço/contribuição, então que eficácia teria o projeto de lei? A eficácia
reside no fato de que algumas pessoas completam o tempo da aposentadoria por
tempo de contribuição depois de completada a idade mínima necessária à
aposentadoria por idade, que é de 60 anos para as mulheres e de 65 para os
homens.
Assim, o
projeto anteciparia a aposentadoria dessas pessoas, porque a contagem do tempo
de contribuição iria incluir o tempo em que o segurado usou do benefício do
seguro-desemprego, caso tenha usado. Seria o caso, por exemplo, dos pescadores
segurados, que utilizam o seguro em momentos de baixa pesca, quando o
empregador deixa de contratá-los. Nesse caso, todos os períodos em que os
pescadores utilizaram o seguro-desemprego seriam contados na contagem dos 30/35
anos para fim da aposentadoria mencionada acima.
Todavia, é de
se pensar que a aprovação desse projeto de lei não ocorrerá, porque, sempre com
o argumento de que a previdência anda tendo muitos gastos, a política econômica
previdenciária busca arrecadar mais e evitar que mais pessoas se aposentem cedo.
É dito que a
previdência tem tido problemas, porque a população brasileira vem envelhecendo,
ou seja, a população de idosos (pessoas acima de 60 anos) tem crescido
bastante. Esse é o argumento pró-governo. Todavia, alguns pesquisadores apontam
que a população economicamente ativa (de 15 a 60 anos) tem crescido bastante
também e que o envelhecimento decorre da melhora de saúde em geral da população
brasileira. Enfim, será difícil que a maioria dos Deputados vote pela aprovação
do projeto.
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