Projeto
de lei número 1.621 de 2007: Terceirização
Marielli Barbato Meneghelli
O projeto de
lei 1621/2007, proposto pelo deputado Vicente Paulo da Silva do PT de São
Paulo, o Vicentinho, regulamenta os atos de terceirização e prestação de
serviços a terceiros nas sociedades de economia mista e no setor privado. O
deputado é bacharel em direito e metalúrgico, ligado ao movimento sindical e
foi presidente da Central Única dos Trabalhadores (CUT).
O projeto foi
apresentado ao Plenário em 12 de julho de 2007 e está, atualmente, na pauta da
Comissão de Desenvolvimento Econômico, Indústria e Comércio (CDEIC). Em 2009,
houve requisição para realização de Audiência Pública pelo deputado José
Guimarães. O projeto de lei 6.832/2010 que trata de contratação de serviços
terceirizados por pessoa de natureza jurídica de direito privado foi apensado
ao projeto 1621/2007 em fevereiro de 2010. Este projeto foi arquivado em
janeiro de 2011, sendo posteriormente desarquivado em fevereiro do mesmo ano.
O tema do
projeto de lei, terceirização, significa a contratação de terceiros para
realização de serviços anteriormente executados por empregados da própria
empresa¹. O projeto, em seu artigo 2°, define como “tomadora” a pessoa jurídica
de direito privado ou sociedade de economia mista que transfere a execução dos
serviços a terceiros; e como “prestadora” a pessoa jurídica de direito privado
que executa tais serviços.
Atualmente, o
assunto possui significativa importância, sendo cada vez mais comum nas
relações trabalhistas. Porém, só começou a ter relevância jurídica no Brasil a
partir do final da década de 1960 e início da década de 1970². A terceirização
foi instituída, permanentemente, pela lei 7.102/83, mas foi objeto do
decreto-lei 200/67 que tratava somente dos serviços terceirizados no âmbito
estatal, além da lei 6.019/74 que regulava o setor privado, autorizando o
trabalho temporário. Já que há pouca legislação sobre o tema, o Tribunal
Superior do Trabalho vem contribuindo para regulamentação dessa atividade,
editando enunciados como, por exemplo, o enunciado número 331. O enunciado 331
do TST, citado na justificativa do projeto de lei, ampliou as possibilidades de
terceirizar serviços, sendo hoje o principal orientador quando se trata do
assunto.
O primeiro
inciso do enunciado afirma que a contratação por pessoa interposta é ilícita,
formando-se o vínculo diretamente com o tomador de serviços, sendo lícita
somente no caso de mão-de-obra temporária. O serviço temporário configura-se na
relação entre uma empresa prestadora de serviços que fornece mão-de-obra pelo
período não superior a três meses para as empresas que precisem de
trabalhadores temporários. O trabalho temporário pode ocorrer em duas
situações: substituição de empregados regulares ou permanentes da empresa ou
acréscimo extraordinário de serviços, como preceitua o artigo 2° da lei 6019/74.
O trabalhador temporário é empregado da prestadora de serviços e não da
tomadora, sendo que, se extrapolado o prazo de três meses, o contrato de
prestação de serviços temporários é convertido em contrato de trabalho entre a
empresa tomadora e o empregado, de acordo com os princípios da continuidade da
relação trabalhista e da primazia da realidade.
O inciso
segundo do enunciado do TST dispõe que o fato de uma empresa prestar serviços à
administração pública não permite que se forme o vínculo de emprego com essa,
ainda que presentes os requisitos da relação empregatícia enumeradas no artigo
terceiro da CLT.
Já o inciso
terceiro do mesmo enunciado autoriza a subcontratação de empresa de vigilância,
limpeza e conservação, bem como os serviços especializados ligados à
atividade-meio do tomador, desde que inexistentes a relação de pessoalidade e a
subordinação direta. É necessário distinguir, portanto, o conceito de
atividade-fim e atividade-meio. A primeira é a atividade central da empresa,
direta, de seu objeto social; a segunda, a atividade desempenhada pela empresa
que não é o seu objetivo central, mas sim uma atividade de apoio ou
complementar. A ausência dos requisitos de pessoalidade e subordinação
significa que o trabalhador é vinculado à empresa prestadora e não à empresa
tomadora, devendo aquela se responsabilizar pelo modo de execução dos serviços
prestados por seu trabalhador no estabelecimento da empresa tomadora.
O inciso
quarto do enunciado 331 do TST trata da responsabilidade subsidiária da empresa
tomadora em relação às obrigações trabalhistas não cumpridas pela empresa
prestadora. A responsabilidade da tomadora, nesse caso, é objetiva, bastando a
comprovação da relação entre as empresas e que empresa tomadora conste do
título judicial para incidir a responsabilidade subsidiária.
Apesar de
tramitarem no Congresso cerca de 20 projetos de lei que procuram regulamentar a
terceirização, hoje a súmula 331 do TST é a principal diretriz acerca do tema,
já que nenhum deles foi aprovado. Por não haver legislação vigente, o projeto
de lei 1621/2007 é, por si só, inovador, além de diferenciar-se dos projetos em
trâmite em alguns aspectos.
O primeiro
aspecto que diferencia o projeto dos demais é a proibição da terceirização
atividade-fim da empresa. O projeto de Vicentinho segue a orientação da súmula
do TST, permitindo somente a terceirização de algumas atividades consideradas
como atividades-meio da empresa. As atividades-fim devem ficar a cargo dos
funcionários da própria empresa, com vínculo de emprego, e não de trabalhadores
de empresas prestadoras de serviços.
O segundo
aspecto que o torna inovador é a influência do sindicato da categoria
profissional no processo de terceirização. Esse deve ser informado com seis
meses de antecedência pelos representantes da empresa quando essa pretende
terceirizar determinados serviços.
O projeto
preceitua em seu artigo 9° que a empresa tomadora é solidariamente responsável
com a empresa prestadora, independentemente de culpa, pelas obrigações
decorrentes do contrato de prestação de serviço, inclusive no caso de falência
da prestadora. Isso significa que o trabalhador terceirizado poderá, a qualquer
momento, cobrar seus direitos decorrentes do contrato de trabalho tanto da
empresa para quem presta o serviço quanto daquela com quem possui vínculo de
emprego. A proposta aumenta a possibilidade de garantia dos seus direitos
trabalhistas, previdenciários e outros, já que não é necessário o esgotamento
dos meios que empresa prestadora possui para que seu empregado exija direitos da
empresa tomadora. Essa disposição é contrária à súmula do TST já que esta
dispõe que a responsabilidade pelas relações trabalhistas da empresa que
terceiriza os serviços é subsidiária em relação àquela que presta os serviços e
não solidária.
Conforme o entendimento
da súmula do TST, o projeto também dispõe acerca da possibilidade de
fornecimento de mão-de-obra terceirizada nos casos de trabalho temporário,
serviços de vigilância, asseio e conservação.
Analisando o
projeto de lei 1621/07 do ponto de vista principiológico trabalhista,
vislumbra-se, primeiramente, o princípio da primazia da realidade em seu artigo
10 que dispõe que haverá o vínculo de emprego entre a tomadora de serviços e os
empregados da prestadora se houver os requisitos do artigo 3° da CLT,
independentemente de não haver contrato de emprego entre a tomadora e os
trabalhadores terceirizados.
Vislumbra-se a
garantia de salário, décimo terceiro salário e gozo de férias remuneradas
presente no artigo 7° da Constituição Federal no projeto de lei em seu artigo
9°, parágrafo 2°. Além disso, o projeto de lei em seu artigo 7° demonstra a
mesma preocupação do constituinte de 1988 em assegurar a redução de riscos
inerentes ao trabalho, por meio de normas de saúde, higiene e segurança.
Já que não há
legislação acerca do tema terceirização, os empregados que atuam nesse tipo de
atividade estão sujeitos a condições desiguais em relação aos empregados das
empresas tomadoras de serviços, sofrendo graves problemas de condição de
trabalho. Tudo isso ocorre porque o trabalho terceirizado é uma maneira de as
empresas produzirem mais lucros, já que, hoje, de acordo com a orientação da
súmula 331 do TST, só precisam arcar com a responsabilidade dos trabalhadores
quando a empresa prestadora não o faz, ou seja, de maneira subsidiária.
A proteção ao
trabalhador, com a regulamentação proposta nesse projeto de lei, é ampliada,
podendo ele recorrer a qualquer uma das empresas, tomadora ou prestadora de
serviços, para buscar seus direitos trabalhistas, previdenciários e quaisquer
outros decorrentes da relação de emprego que possui com a empresa prestadora,
independente de a empresa tomadora ter ou não responsabilidade.
Com o presente
projeto, a tomadora deve oferecer condições iguais de trabalho e benefícios
entre empregados terceirizados e seus empregados, devendo fornecer salário,
décimo terceiro salário e férias quando a prestadora não o fizer. Além disso, o
projeto prevê multa de dez por cento sobre o valor do contrato de terceirização
em favor do trabalhador prejudicado se houver o descumprimento do regulamentado
na lei.
Portanto, o
projeto de lei 1621/2007 oferece a regulamentação necessária para a
terceirização de serviços, fornecendo mais mecanismos para proteção do
trabalhador terceirizado, respeitando os preceitos constitucionais e os
princípios trabalhistas.
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